De volta ao lar...
Finalmente, depois de 3000 milhas, sendo 1800 em contra-vento, o Redboy
está nas águas de Angra dos Reis novamente! Como não tenho mais testosterona
para uma aventura deste tipo, contratei o Átila Bohn, de Salvador, e seu fiel
escudeiro, o João José. Eles saíram de Puerto la Cruz, VE no início de dezembro,
passaram por Isla Margarita e quando navegavam próximo à Península de Pária
foram abordados pela Guarda Costeira Venezuelana. Subiram a bordo com coturnos e
metralhadoras, fizeram uma revista no barco, deixaram uma bagunça e foram
embora. Mas antes chamaram o João lá prá dentro e mostraram um pacote com um
quilo de talco, usado para conserto em fibra de vidro e queriam saber o que era!
O policial só se convenceu que era talco depois de experimentar... Depois que
eles saíram é que foi dada falta de um relógio de pulso com bússola, barômetro
etc e um dinheiro que estavam em uma gaveta...
Mas o pior ainda estava para acontecer: algumas horas depois foram abordados por
um barco com cinco homens armados!!! Até parece que foi combinado com a polícia.
(Será??????) Aí amarraram os dois na proa enquanto quatro entraram no barco e um
ficou cuidando. Resultado: levaram dois motores de pôpa, um Garmin Chartplotter,
um arbalete, celulares, roupas de neoprene, lanterna e faca de mergulho, VHF portátil, algum
dinheiro, e o mais importante, a minha querida caixa de ferramentas...
Felizmente o dinheiro
estava guardado em vários lugares diferentes e eles não levaram os cartões de
crédito, pois o Átila disse que precisava deles pra continuar viagem!!! Quando
saíram, depois de desamarrar os dois, jogaram as carteiras deles com os
documentos no cokpit.
Deixaram, felizmente, muitas outras coisas de valor, como o rádio SSB, o gerador Honda, furadeiras
sem fio, etc e levaram um daqueles quadros decorativos com nós! E um
"puxa-saco", daqueles onde se guarda sacolas plásticas! Bom,
menos mal, não houve nenhuma violência e o Átila e João só saíram abalados
emocionalmente.
Então pararam mais tempo do que o previsto em Trinidad, pois precisavam comprar
ferramentas e se recuperar do susto. Aí teve uma boa notícia: havia uma
encomenda para o Redboy na alfândega. Era um conjunto completo de instrumentos,
deep, speed e wind igual ao que foi instalado oito meses antes lá mesmo. O
fabricante deve ter mandado duas vezes a mesma encomenda, pois reclamamos muito
do atraso na época. Vou vender no Brasil para recuperar um pouco do prejuízo!
Depois de Trinidad fizeram uma parada em Koureau, para abastecer (usaram mais de
500 horas de motor no total, de Puerto La Cruz até Angra), depois em Luiz Corrêa, já no nosso querido Brasil.
Lá substituíram o pêndulo do leme de vento que era de fibra e não agüentou o
tranco por um de madeira, muito bem feito, obra de um artesão local.
Tem umas particularidades nesta travessia, próximo ao rio Orinoco e Amazonas que
são bem interessantes. A força da maré causa uma correnteza perpendicular à
costa que te tira até 20 milhas da rota em poucas horas. Depois de algum tempo
eles já estavam craques em tirar proveito deste fato.
Finalmente depois de 1800 milhas contra o vento e corrente, o Cabo Calcanhar! E
daí pra frente é morro abaixo! O meu plano inicial era pegar o barco em
Salvador, mas como eles já estavam com um bom ritmo, pedi que viessem até Angra,
pois queria aproveitar o Carnaval por aqui. Chegaram dia primeiro de fevereiro.
O barco se comportou muito bem, estruturalmente. Nada de importante quebrou.. No
motor só foi trocado óleo, filtros, um rotor da água salgada e duas correias em V (com menos de
100 horas de diferença!), mas apareceu um vazamento no túnel do eixo do
hélice. Um engate do runner de BB também quebrou. No mais umas panes na parte
elétrica e o piloto automático deixou de funcionar logo no início da viagem. Ainda bem que tinha o leme
de vento! Considerando a dureza da travessia, acho que foi um saldo muito
positivo.
Algumas considerações sobre o Caribe...
Você está pensando em ir com teu barco para o caribe? Pense muito bem antes,
porque prá voltar não é fácil.
Se é para conhecer, pegue um avião, desça em Union Island, alugue um veleiro e
fique duas semanas curtindo as Granadinas, que são o lugar mais bonito do
Caribe. Reserve uma semana para ancorar em Tabago Cays. Você vai ter visto quase
tudo o que é interessante. Depois entregue as chaves do barco dê tchauzinho e pegue um avião de
volta. Custa caro? Menos do que se manter por lá por mais de um ano, quase dois, que é o
tempo que vc precisa para ir e voltar, considerando a temporada de furacões.
O Brasil, principalmente Angra dos Reis, não perde em nada para o Caribe, a não
ser a água que não é tão limpa. Mas é muito mais barato, se fala português, o
povo é mais bonito e simpático, não tem furacão, se gasta em Reais. Vou voltar
pro velho esquema, primeiro semestre no sul, segundo no nordeste...
Outra coisa tão ou mais importante do que o barco, se você ainda não se
convenceu e quer ir prá lá: escolha com muuuuito cuidado a tua tripulação. Tem
que ser pessoas dispostas a colaborar, a se superar. Que digam: estamos nesta
juntos. Se não houver uma história de alguns anos juntos, no caso de casais, é melhor não ir. A
vida em comum a bordo não é para qualquer um. Não se iludam.
Falar inglês é fundamental. Do contrário vocês vão ficar à parte da comunidade
náutica por lá. Todo mundo fala inglês, até os franceses! Se esperam encontrar
brasileiros, são raros e ariscos... Quando um sueco ancora o barco, ele ergue a
bandeira da Suécia no topo do mastro. Logo chegam mais um ou dois barcos suecos.
Os brasileiros se isolam.
Quando ainda estava em Curitiba pensando nesta viagem, um sujeito que também
estava pensando em fazer o mesmo não quis conversar comigo com medo que eu
roubasse os patrocinadores dele! Em Fortaleza, antes de que quatro barcos
brasileiros saíssem juntos para o Caribe, outro me disse que não gostaria que eu
o acompanhasse na travessia pois o projeto dele era diferente do meu!!! Ou então
o caso é comigo, sei lá.
Destes quatro barcos que saíram, o único que continuou no plano inicial é o Hipocampus, do Newton, que já
deu a volta ao mundo e está de volta na Bahia!!! E era o que parecia ter menos
condições, pelo barco, um Samoa 29 feito em casa. Mas o Newton tem uma vontade férrea e humildade suficiente para
não cuspir prá cima. Dos outros três, um perdeu o mastro, a namorada e desanimou (eu), outro
abalroou um OFNI (Objeto Flutuante Não Identificado) na costa da Flórida e perdeu o barco. Do terceiro (aquele do
projeto diferente, da Bahia) não tive mais notícias, mas pelo jeito mudou o
projeto dele, pois era para dar a volta ao mundo também...
Carnaval em Angra, de novo... Regata de Caras, de novo...
Quando estava chegando de ônibus em Angra vi o Redboy entrando no porto! Se
tivesse combinado não daria certo... Ajudei a pegar os cabos para atracar e
ficamos até tarde da noite comentando as peripécias da viagem. Vou pedir para o
Átila e o João fazerem um texto sobre a viagem. Se eles toparem vou publicar
aqui. Vai ser muito interessante.
No sábado de carnaval chegou a Lilli, o filho e um amigo para passarem o
Carnaval. Foram dias ótimos nos velhos lugares de sempre: Abraão, Palmas, Sítio
Forte... Êta saudade!
Depois que eles foram embora, tirei o barco da água para consertar o túnel do
eixo do hélice. Trabalho rápido, em dois dias estava na água de novo. Tinha
pensado em pintar o fundo também, mas estava ainda muito bom. Vou deixar para
mais tarde, aí pinto também o costado. O barco foi tirado na marina Velrome,
caríssima. Sugiro pesquisarem outras opções aqui por Angra...
Estou escrevendo isto na sexta, 18/2/2005. Hoje chega meu filho para
participarmos da Regata de Caras, sábado, juntamente com outros amigos, Mario e
Manolo. Vai ser o barco dos quatro M: Mario, Mario, Mario e Manolo. Tá faltando
uma Marlene...
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